Arguida em Angola, fora do EuroBic e com gestor ferido. Cerco a Isabel dos Santos volta a apertar-se

Se as primeiras 24 horas que se seguiram à publicação das primeiras linhas da investigação Luanda Leaks foram arrasadoras para Isabel dos Santos, toda a primeira semana tem somado novos rombos e pode continuar a somar consequências, a avaliar pelos acontecimentos desta quarta-feira. Não só Isabel dos Santos foi formalmente constituída arguida em Angola neste dia, como a justiça angolana parece estar a movimentar-se para, se necessário, emitir um mandado de captura internacional — incluindo um pedido de extradição a Portugal, a avaliar pela reunião de urgência marcada entre os procuradores dos dois países.

Ao mesmo tempo, o cerco aperta-se também em torno dos seus colaboradores mais próximos em Portugal. Três deles, administradores não-executivos da NOS, foram chamados pelo Comité de Ética da operadora para darem explicações sobre o seu envolvimento no caso. Dois deles foram constituídos arguidos em Angola, suspeitos de agirem como testas de ferro da empresária, a par de outros dois cidadãos portugueses. Em relação a um, soube-se, entretanto, que esteve envolvido num episódio de violência com contornos suspeitos, com a Polícia Judiciária a avaliar a possibilidade de uma tentativa de suicídio, mas também de simulação de tentativa de suicídio ou até de tentativa de homicídio.

Como se não bastasse, a pressão que foi sendo feita pelo Banco de Portugal, de acordo com o Expresso, parece ter dado resultado: esta quarta-feira, o EuroBic anunciou que Isabel dos Santos irá vender a sua participação maioritária no banco. É um duro golpe para a empresária angolana, que detinha ao todo 42,5% das ações, e que agora terá de sair do banco português.

Isabel dos Santos, a arguida suspeita de branqueamento de capitais e abuso de poder

Foi numa conferência de imprensa em Luanda, da qual a cadeia de televisão pública angolana TPA emitiu um resumo no seu jornal das oito, que o Procurador-Geral de Angola transmitiu a novidade:  “Posso adiantar que este processo já foi transformado em processo-crime e que algumas pessoas foram constituídas arguidas, nomeadamente a própria senhora Isabel dos Santos”, declarou Hélder Pitta Grós.

“Posso adiantar que este processo já foi transformado em processo-crime e que algumas pessoas foram constituídas como arguidas, nomeadamente a própria senhora Isabel dos Santos.”

Hélder Pitta Grós, Procurador-Geral Republica de Angola

Em causa está um processo-crime aberto pela justiça angolana, na sequência das denúncias apresentadas por Carlos Saturnino, presidente do conselho de administração da Sonangol, que corre a par de outro processo administrativo, no âmbito do qual Isabel dos Santos já teve contas bancárias e participações em empresas arrestadas.

E Hélder Pitta Grós concretizou quais são as suspeitas do Ministério Público angolano: branqueamento de capitais, falsificação de documentos, abuso de poder e tráfico de influências são alguns dos crimes que podem estar em causa.

Os quatro portugueses que Angola considera testas de ferro de Isabel dos Santos

A constituição de Isabel dos Santos como arguida é, por si só, um abalo forte para a empresária. Mas não foi o único. Na mesma conferência de imprensa, a empresária ficou a saber que a justiça angolana não só está atrás de si, como também constituiu arguidos quatro dos seus colaboradores próximos, todos eles portugueses:

  1. Mário Leite da Silva, gestor de Isabel dos Santos e presidente do Conselho de Administração do Banco de Fomento de Angola;
  2. Sarju Raikundalia, ex-administrador financeiro da Sonangol;
  3. Paula Oliveira,amiga de Isabel dos Santos e administradora da NOS;
  4. Nuno Ribeiro da Cunha, diretor do private banking do EuroBic em Lisboa.

Pitta Grós deixou claro qual considera ter sido o papel de todos eles na teia de ilegalidades que suspeita terem sido cometidas por Isabel dos Santos à frente da Sonangol: “São pessoas cujos nomes aparecem sim, mas são de fachada, já que as empresas pertencem de facto a Isabel dos Santos”, resumiu.

Em causa estará o caso da Matter, a empresa sediada no Dubai para a qual a Sonangol terá transferido, de forma irregular, quantias avultadas, que foram classificadas como pagamentos de serviços de consultoria, como revelou a investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ na sigla original). A Matter é formalmente dirigida pela gestora Paula Oliveira, administradora não executiva da NOS, e por Mário Leite da Silva, o “braço direito” de Isabel dos Santos nos negócios. Já Sarju Raikundalia é ex-administrador financeiro da Sonangol e, de acordo com o Luanda Leaks, terá facilitado as transferências para a Matter. Por fim, Nuno Ribeiro da Cunha não foi inicialmente referido na investigação do consórcio, mas, sabe-se agora, é o gestor de conta da Sonangol no EuroBic que terá autorizado as transferências financeiras.

Jorge Brito Pereira, o advogado de Isabel dos Santos que ajudou a criar a Matter e que foi mencionado nos Luanda Leaks, não foi constituído arguido em Angola.

NOS exige explicações a administradores envolvidos nos Luanda Leaks

Ao longo da semana, o cerco já tinha começado a apertar para alguns destes portugueses. Esta quarta-feira, o Jornal de Negócios revelou que o Comité de Ética e a Comissão de Governo Societário da NOS decidiram chamar os três administradores não executivos envolvidos nos Luanda Leaks: Paula Oliveira, Mário Leite da Silva e Jorge Brito Pereira.

A decisão de pedir explicações aos três administradores foi tomada ainda antes de uma reunião do conselho de administração, que aconteceu ao final do dia de terça-feira.

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