Manuel Rabelais reparte responsabilidades com eventuais apoios à comunicação social

Ouvido na reabertura da audiência de discussão e julgamento no processo número 68/2018 por suposta gestão danosa de bens públicos no antigo GRECIMA, Manuel Rabelais citou as empresas Edições Novembro, Angop, RNA, TPA, TV Zimbo, Interactive, Semba Comunicações (de Welwítschia dos Santos “Tchizé”, filha do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos), e o Ministério da Comunicação Social.

“É possível que, com ‘cartas de conforto’ para o BNA, possa ser esse o valor. Eu era o coordenador dos órgãos de comunicação social e a Organizações Chana fornecia viaturas a essas empresas”, disse Manuel Rabelais, perante uma sala reduzida a um terço da sua capacidade de cerca de 60 pessoas. Questionado se conhecia o valor exacto, Manuel Rabelais disse que “é muito difícil responder a essa questão porque nem sempre o BNA atendia aos pedidos do GRECIMA”.

A sessão de ontem ficou marcada pela exploração, por parte do tribunal, de algumas contradições de Manuel Rabelais em relação às declarações que fez na primeira sessão da audiência de discussão e julgamento. O juiz principal da causa notou contradições pelo facto de Manuel Rabelais ter dito que o GRECIMA era um órgão do Presidente da República. Em função disso, o juiz confrontou o ex-director do extinto GRECIMA com facto de ser este órgão apenas auxiliar do Presidente da República.

Manuel Rabelais insistiu que no organograma da Presidência da República não aparecia o GRECIMA como órgão do Presidente da República, mas foi criado para auxiliar o Presidente da República. O juiz principal da causa insistia na necessidade de um esclarecimento. Esta questão, que consumiu cerca de 20 minutos a abrir a sessão, obrigou o juiz, insatisfeito com as respostas, a pedir que ficasse registada na acta da sessão.

“Novamente interrogado de que o GRECIMA não é um órgão auxiliar do Presidente da República, respondeu não era órgão auxiliar do Presidente da República, porque o mesmo não integrava o organograma dos órgãos auxiliares do Presidente da República”, mandava o juiz consignar na acta da sessão. O juiz insistia que ficasse também registado que, “interrogado, depois de lhe ter sido dado a ver o ofício por ele (Manuel Rabelais) assinado, a Válter Filipe, então governador do BNA, à data dos factos, do qual consta que o GRECIMA é um órgão essencial auxiliar do Presidente da República, o arguido respondeu que não é órgão auxiliar e que aqui figura como tal apenas por depender directamente do Presidente da República”, sustentava o juiz ao esclarecer a Manuel Rabelais o que ele mesmo disse na abertura da audiência de discussão e julgamento. Todas contas em nome do director

Manuel Rabelais, à data dos factos também secretário para Comunicação Institucional e Imprensa do Presidente José Eduardo dos Santos, foi confrontado com o facto de todas as contas do GRECIMA estarem em seu nome e por ele assinadas. Questionado se, ao proceder assim, não sabia que estava a violar a lei, Manuel Rabelais respondeu com um enfático “eu não tinha conhecimento se estava a violar as leis, também porque o GRECIMA não era comparado a um ministério. Desconhecia e, dada a situação em que o país se encontrava, não restava opção.”

Manuel Rabelais insistiu que a prática adoptada era para “acudir necessidades pontuais e emergenciais, designadamente, acções de carácter estratégico.” Interrogado se, nos contactos que teve com Valter Filipe, perguntou a venda das divisas era ou não legal, Manuel Rabelais reconheceu que não. O juiz insistiu, questionando se, em algum momento, comunicou ao então Presidente da República sobre a necessidade da venda de divisas. Na resposta, o então director do GRECIMA interrompeu o juiz, dizendo que era necessário um contravalor.

Na sequência do interrogatório, o juiz quis saber de Manuel Rabelais se era permitido por lei a revenda de divisas adquiridas ao BNA a diversas instituições. O ex-director do GRECIMA respondeu que também outras instituições procediam da mesma forma.  O juiz retorquiu: “Vocês faziam porque os outros também o faziam?” Manuel Rabelais insistiu que era necessário um contravalor. GRECIMA era casa de câmbios?  

Vezes sem conta, no interrogatório do juiz, Manuel Rabelais revelava nervosismo, interrompendo frequentemente o juiz para rectificar ou acrescentar o que acabava por dizer.  “Quer dizer…, desculpa venerando juiz principal…, quero precisar uma coisa; não era bem isso que queria dizer” eram as palavras que frequentemente dizia num tique nervoso.

Questionado se o GRECIMA estava directamente a vender divisas, Manuel Rabelais disse que o GRECIMA não era uma instituição financeira, mas admitiu que “teve de obter contravalor de instituições privadas porque não os tinha do Orçamento Geral do Estado para o efeito. O juiz lembrou a Manuel Rabelais que, de acordo com a acusação do Ministério Público, o GRECIMA estava a realizar uma actividade própria de uma casa de câmbios.

Manuel Rabelais rebateu, dizendo que essa qualificação “é muito redutora.” Interrogado se, na abertura de contas bancárias, terá exigido, tal como acusa o Ministério Público, que fosse ele o único assinante, o ex-director do GRECIMA respondeu que “nunca o teria feito.” A anatomia do esquema como o GRECIMA não era uma instituição financeira fosse de que natureza fosse, o BNA, em plena crise de cambiais, só vendia os dólares aos bancos comerciais. A táctica usada pelo GRECIMA era simples. Abrir contas bancárias em vários bancos comerciais, incluindo o Banco de Comércio e Indústria (BCI). Curiosamente era o GRECIMA quem fazia os pedidos de aquisição de divisas ao BNA para pagar serviços. Esse dinheiro ia parar a várias contas nos bancos comerciais onde, depois, o GRECIMA, ou melhor, Manuel Rabelais “endossava” alguém para levantar. Questionado se, depois de vendidas as divisas, dava a conhecer ao BNA sobre o destino que deu aos dólares, Manuel Rabelais soltou um ruidoso “não”. E se dava a conhecer ao Presidente da República os dinheiros disponibilizados pelo BNA, Manuel Rabelais disse que sim, mas verbalmente.

Texto: Jornal de Angola

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