Propinas e emolumentos no ensino superior atribulam estudantes angolanos e prometem manifestações para contestar a medida.

Estudantes universitários e ativistas manifestavam-se contra a pretensão do Governo de cobrar propinas no ensino superior regular, a partir de 2020, Luanda, Angola, 26 de outubro de 2019. AMPE ROGÉRIO/LUSA

Estudantes angolanos lamentaram hoje a aprovação da cobrança de propinas e emolumentos no ensino superior, considerando que vai impedir muitos alunos de acederem às universidades, e admitem manifestações para contestar a medida após a quarentena imposta pela covid-19.

Para o Movimento Estudantil “Propina Não”, o decreto presidencial que aprova a cobrança de propinas e emolumentos no ensino superior público vem “enlutar a vida dos estudantes, maioritariamente desempregados”.

Segundo o líder do movimento, Arante Kivuvu, o diploma “vai dificultar a vida do cidadão, visto que boa parte dos estudantes são desempregados e não têm possibilidades de pagar propinas e demais emolumentos”, defendendo a “gratuitidade” nesse domínio.

“A emissão de certificados e diplomas subiu, por isso achamos que o Governo está a agir de má-fé, porque neste momento de quarentena não é ocasião para aprovar essa lei”, afirmou hoje em declarações à Lusa.

As instituições do ensino superior públicas angolanas passam a cobrar, a partir do ano académico 2021, propinas nos valores de 1.900 kwanzas (3 euros), para o período regular, e 15.000 kwanzas (24,3 euros), para o período noturno, segundo uma nova tabela de emolumentos.

A tabela de valores de propinas e de emolumentos a cobrar pelas instituições públicas do ensino superior consta do Decreto Presidencial n.º 124/20, de 4 de maio, que aprova o Regulamento sobre Propinas, Taxas e Emolumentos nas Instituições Públicas de Ensino Superior.

Segundo o regulamento, já publicado em Diário da República, a cobrança e o pagamento de propinas e emolumentos tem como objetivo a “obtenção de recursos financeiros” que concorrem para uma “prestação de serviços de qualidade nos domínios do ensino, investigação científica e extensão universitária”.

A tabela anexa ao decreto assinado pelo Presidente angolano, João Lourenço, estabelece também vários emolumentos, nomeadamente 5.000 kwanzas (8 euros) como valor para inscrição em exame de acesso e 4.000 kwanzas (6,4 euros) para matrícula e inscrição para o ano letivo.

Para Arante Kivuvu, um dos membros do processo ’15+2′ (grupo de ativistas angolanos detidos em 2016), depois do período de quarentena imposto pela covid-19, o Movimento Estudantil “Propina Não” deverá tomar uma posição e “manifestações contra o decreto não estão descartadas”.

“Porque o decreto não favorece os estudantes, e sempre dissémos que com a implementação de propinas no ensino superior público o ensino de Angola entra em luto, muitos não vão conseguir dar sequência aos estudos”, frisou.

O ativista cívico entende, por outro lado, que o “contexto atual obriga à gratuitidade neste subsetor de ensino”, visto que “boa parte dos estudantes são vulneráveis e não tem condições para suportar essas despesas”.

“E a situação é agravada pela crise económica do país e agora mais com a covid-19. Achamos que o decreto mata o sonho de muitos jovens”, sublinhou.

Já o Movimento dos Estudantes de Angola (MEA) também converge com o posicionamento do Movimento Estudantil “Propina Não” e refere que o diploma legal manifesta o “desinteresse que o executivo angolano tem para formar os jovens e proporcionar uma educação de qualidade, de excelência e digna”.

“Vimos que a maior parte dos jovens/estudantes é desempregada, implementar pagamento de propinas no ensino superior no período laboral é acabar com o sonho de muitos que querem ir para a universidade”, disse a secretária adjunta para Informação do MEA, Teresa Joaquim.

Para a dirigente associativa, os emolumentos expressos no decreto “não são aceitáveis ao contexto do país, pois maior parte de nós somos desempregados e se trabalha o salário não é digno para repartir”.

O cartão de estudante das instituições públicas do ensino superior passará a custar 2.000 kwanzas (3,2 euros), o exame de recurso 5.000 kwanzas (8 euros), declaração sem notas 3.000 kwanzas (4,8 euros) e declaração com notas 5.000 kwanzas.

As aulas no ensino superior em Angola estão canceladas, desde março, devido ao estado de emergência que visa conter a propagação da covid-19, que causou até agora 36 infetados e dois mortos no país.

O ministério do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação angolano anunciou, na segunda-feira, que a retoma da atividade letiva presencial, pós-estado de emergência devido à covid-19, prevê aulas aos sábados para o cumprimento dos programas curriculares.

O ano académico 2020 deve prolongar-se até janeiro de 2021, conforme perspectivam as autoridades.

Texto: Agência Lusa
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