“27 de Maio”: Filhas de Nito Alves e Saidy Mingas recebem certidões de óbito

As filhas de Alves Bernardo Baptista, “Comandante Nito Alves”; e de Avelino Vieira Dias Mingas “Saidy”, também, “Comandante Lutuima”, receberam, ontem, em Luanda, certificados de homenagem e certidão de óbito atribuídos pelo Executivo, no quadro do plano de reconciliação com as vítimas dos conflitos políticos ocorridos no país desde a Independência até à conquista da paz definitiva, em 2002.

Eunice Alves Bernardo Baptista e Xissole Madeira Vieira Dias Mingas receberam os respectivos certificados de homenagem e certidão de óbito das mãos do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, em cerimónia reservada, mas a que o Jornal de Angola teve acesso, na sede da instituição governamental.

 As certidões de óbito foram emitidas com base no Regime Especial de Justificação de Óbito ocorridos em consequência dos conflitos políticos, aprovado pela Lei nº 23/20, de 10 de Junho, e do Decreto Presidencial nº 209/20, de 4 de Agosto, que cria a Comissão de Averiguação e Certificação de Óbitos das Vítimas dos Conflitos Políticos. 

 Xissole Madeira Vieira Dias Mingas admitiu que não foi fácil, enquanto criança, perguntar às pessoas sobre o paradeiro do pai e não obter respostas. “Isso provoca dor e rapidamente habituei-me a não fazer perguntas sobre o meu pai”, confessou. 

 A jovem, jurista e docente de Direito do Ordenamento do Território e Ambiente, lembrou que sempre ouviu falar do pai como bom, amigo, mas ninguém aceitava falar dele como intelectual, político e militar. Xissole Mingas acredita que “pode ser que, agora, os historiadores comecem a escrever sobre tudo isso, para sabermos o que aconteceu e como aconteceu.” 

 “O 27 de Maio não esteve encoberto apenas pelas autoridades, todas as casas de famílias angolanas têm uma história sobre esse dia e todas preferiram esquecer e não falar , não buscar, nem remexer naquilo que causa dor”, afirmou. 

 Eunice Alves Bernardo Baptista, hoje uma mulher de negócios, lembrou que a única memória que guarda do pai é o rosto dele. “O pai para nós era tudo, o nosso alicerce. Não tive o carinho dele, só guardei tristeza por tudo que aconteceu”, referiu. 

 Na cerimónia, com palavras de circunstância, o ministro Francisco Queiroz reconheceu que foi um acto de coragem da parte das órfãs terem suportado o sofrimento em consequência da morte dos pais.  

 “Reconhecemos que a ausência de informação durante todo esse tempo causou muita dor e, até, exclusão social”, referiu, acrescentando que chegou finalmente o momento de reconciliação e da pacificação dos espíritos. O ministro desejou às órfãs de Nito Alves e de Saidy Mingas que se sintam, como sempre deveriam ter sido consideradas da parte dos angolanos. 

 Pediu colaboração das famílias para um desfecho honroso à memória daqueles que pereceram nos conflitos armados desde 11 de Novembro de 1975 a 4 de Abril de 2002. 

 A entrega de certidões de óbito e de certificados de homenagem está enquadrado no plano de reconciliação com as vítimas de conflitos políticos executado pela Comissão para Implementação do Plano de Reconciliação das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP), coordenado pelo ministro Francisco Queiroz e integrada por várias entidades da sociedade civil e familiares das vítimas.  

 O processo de entrega de corpos das vítimas de conflitos políticos, no quadro dos trabalhos da CIVICOP, começou, formalmente, na quinta-feira, mas havendo a necessidade de assegurar o procedimento de identificação dos restos mortais, decorre ainda a fase de identificação visual e de recolha de amostra para testes de ADN às famílias consanguíneas e às ossadas das vítimas. 

 Só depois dos testes de ADN e do cruzamento com as ossadas das vítimas é que deve ser entregue o respectivo corpo a cada família, com base na identificação feita. 

Fonte: JA

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