“O sector bancário tem sido um elemento estrangulador da actividade económica”

Estamos a caminho da quinta recessão, o consumo tem estado em queda sucessiva. Como é que o responsável de uma das maiores empresas da área da tecnologia olha hoje para a economia angolana?

Muito preocupado. Mas mais preocupado com as vertentes que conduzem a economia. A educação, saúde, porque tudo isso também são vectores económicos para a diversificação económica da produção nacional, para infraestrutura do País, que me parece que está muito mal. Fala-se em produção
nacional, mas depois temos a informação de que existem toneladas de produtos a apodrecer por não
terem escoamento. Uma vez escoado, não há centros logísticos de conservação. Isto é de facto
muito preocupante.

Há, portanto, muito por fazer na chamada diversificação económica…

Muito poucos países conseguem sobreviver, por si só. Precisam de se abrir aos mercados externos e
nós, em particular, pela natureza dos nossos serviços e produtos, estamos obrigados a recorrer
bastante às importações. O acesso às divisas cria-nos alguns constrangimentos. Os bancos não têm
funcionado muito. A desvalorização do kwanza é extremamente penosa para nós, porque, por vezes, as operações que fazemos, fazemos com prejuízos, e isso não é bom para a economia. A economia é boa
quando as empresas estão bem, quando há consumo, crescimento, quando as pessoas têm dinheiro para fazer compras. Se não há consumo a economia não pode estar bem. O sector bancário tem sido um elemento estrangulador da actividade económica. É importante que se resolva a questão das divisas e outras. Temos perdido a confiança de muitos fornecedores por não cumprimento nos pagamentos.

A banca não está preparada para acompanhar o crescimento das empresas angolanas?

Do ponto de vista operacional acredito que haja capacidade instalada para operar normalmente.
Isso não tenho dúvidas.

Mas o BNA tem dito que as dificuldades no acesso às divisas têm sido ultrapassadas…

É a posição do BNA. Mas a nossa experiência não tem sido essa. Temos tido algumas dificuldades.
Acredito que tenha havido um período pior e que, neste momento, esteja ligeiramente melhor. Mas
não está resolvido.

É importante resolver esta questão?

É determinante. É um factor estrangulador.

Para minimizar este problema a Sistec pensa na produção interna de algum material que ainda
importa?

Já produzimos. Fomos das primeiras empresas da indústria ligeira a produzir computadores.
Produzimos computadores em Angola e estes computadores eram tão bons como os que se importam,
porque os componentes viam do mesmo sítio. A diferença era que a nossa marca não tinha como
concorrer com as grandes marcas. Tivemos também uma linha de montagem de televisores, mas fruto
de contingências resultantes de diversos factores conjunturais, não era produtivo continuar a
produzir, porque na verdade os televisores importados ficavam mais baratos que os que nós
fabricávamos. Fabricámos também cofres à prova de fogo, mas também parámos porque torna-se
muito difícil ter uma indústria a funcionar quando não há água, luz, transportes públicos,
segurança. E isso acaba por se constituir em encargos de estruturas extremamente pesados e torna
inviável qualquer projecto

Não faltou uma estratégia da Sistec na divulgação dos seus produtos?

Acho que, às vezes, é uma questão de fé. Todos nós já temos ideias pré-concebidas. Por exemplo,
se Angola produzir um determinado produto e a pessoa tiver a possibilidade de comprar o mesmo
produto mas produzido lá fora, vai optar pelo produzido lá fora.

Não há crença na produção nacional?

Até hoje acho que não há. Começa a haver mais a nível de produção agro-industrial. Tem de haver mais informação, muitíssima mais produção, consumo. Tem de haver muito mais provas de que estamos seguros em consumir o que é nosso.

O “made in Angola” para a indústria não funciona?

O “made in Angola” vai ter de funcionar, mas não é só pôr lá o selo. Há um desafio maior, tem de
lutar pela excelência para derrotar o que vem de fora. Porque entre dois produtos iguais, às ve-
zes, há tendência para ir para o produto que vem de fora, que nem sempre é o melhor.

Este é um trabalho do Executivo ou das empresas?

É um trabalho conjunto. Das empresas, pela responsabilidade da produção, e do Executivo, pelo
apoio que terá de dar a nível do comércio externo.

Que avaliação faz do sistema tributário nacional?

Quando se pretende tributar, ir buscar dinheiro, tudo bem. Agora, se se começa a matar as em-
presas, não tem onde ir buscar dinheiro. É um pouco como nós nos sentimos. Ou seja, sentimos um
aumento de impostos. Entendemos que o IVA foi importante para regulamentar o mercado
informal, mas a forma como está aplicado lesa bastante o negócio que se faz, com base no crédito.

Porquê?

Uma empresa pode não ter dinheiro para adquirir um computador e pretende comprar a crédito, a
empresa se faz isso tem de pagar o IVA imediatamente. Isto não é justo. Não é justo este
pagamento à cabeça. Por outro lado, as taxas fiscais são demasiado elevadas. O Imposto Sobre o
Rendimento do Trabalho (IRT) é uma amostra disso. Quando as pessoas já perderam o seu poder de
compra têm os seus salários desvalorizados, ainda levam com este imposto! Peço desculpa por não
ser politicamente correto, mas isto é um erro muito grave. Não só do ponto de vista social, como
inclusivamente político. Não se pode estar a agravar as condições das pessoas quando as pessoas
já estão em condições extremamente degradantes.

Texto: Expansão
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